100.º ANIVERSÁRIO DO VOTO DE PEREGRINAR ANUALMENTE AO MONTE DE SANTA LUZIA
O voto da cidade
“Era em Outubro de 1918. A cidade de Viana estava contristada pelo luto e sofrimento que a Pneumónica levára às suas casas. Andavam todos apavorados com o incremento da epidemia e chadas, ruas desertas, a vida comercial inteiramente paralizada, os entêrros faziam-se de noite, à mesma hora e sem toque de sinos, para não assustar os que ainda sobreviviam.
(…)
Por motivos particulares é que só no dia 7 de Novembro de 1918 principiou nas duas igrejas paroquiais desta cidade um tríduo de preces afim de implorar do Altíssimo o têrmo da epidemia.
No domingo, 10 de Novembro, às 4 horas da tarde, saía da igreja de San-Domingos uma procissão de penitência com o SS.mo Sacramento, e durante ela se rezaram as ladainhas de Todos-os-Santos, do Sagrado Coração de Jesus e o rosário.
A procissão andou em volta da cidade para recolher no santuário de Nossa Senhora de Agonia.
Era ao fim da tarde. O Sol já mergulhava no mar os seus últimos raios, quando a procissão chegou ao seu têrmo.
No Campo de D. Fernando, a multidão, entre a qual se encontrava muitos convalescentes que não podiam ainda reprimir os restos da tosse que lhes escangalhava o peito, reunia-se num bloco de milhares de pessoas. Por entre elas corria a triste notícia do recém-falecimento de mais duas vítimas ceifadas pela terrível moléstia.
Era de abatimento a fisionomia de todos os rostos, e os corações estavam tristes como a noite que já pela terra estendia o seu negro manto. Os fiéis ajoelhavam-se sôbre a erva ressequida para cantar Tanto ergo e receber a Bênção do SS.mo Sacramento, que do adro de Nossa Senhora da Agonia ia ser lançada sôbre o povo. Viam-se lágrimas a deslizar pelas faces, quando, no meio de um religioso silencio, umm sacerdote pronunciou em nome de todos a consagração ao Sagrado Coração de Jesus, dizendo bem alto que o povo de Viana ali rendido e humilhado aos pés da Sagrada Hóstia, prometia ir no futuro verão, em piedosa romagem à montanha de Santa Luzia, consagrar-se novamente ao Coração amante do nosso adorável Salvador, se Ele pusesse têrmo ao terrível flagelo e não permitisse que sôbre esta terra viesse outra calamidade semelhante.
As duas vítimas daquela tarde foram, nesta cidade, as últimas colhidas pela epidemia. Cessou a peste, que até hoje ainda não nos tornou a visitar.
O Sagrado Coração de Jesus ouviu aquelas súplicas e só restava que o povo da cidade cumprisse o que prometeu.
No verão de 1919, a-pesar-de repetidas instâncias de uma ilustre comissão, a autoridade civil não consentiu que Viana cumprisse o seu dever.
Em Setembro dêsse mesmo ano constituiu-se uma grande comissão formada pelas senhoras da mais alta respeitabilidade no concelho e foi ter uma audiência com o ex.mo sr. governador civil. Expôs-lhe a comissão o fim que tinha em vista, e S. Ex.ª, prometendo uma resposta definitiva, veio depois dizer que não consentia que se fizesse a referida peregrinação.
Passou-se um ano, e em Maio de 1920 foram ter com o sr. governador civil e disseram-lhe que noticiavam os jornais o aparecimento da gripe-pneumónica nas ilhas da Madeira, e, como esta cidade estava em dívida para com Deus, as mesmas pessoas que no outro ano lhe tinham ido falar, resolveram cumprir então a promessa da cidade, fazendo a peregrinação no dia 13 de Junho, domingo posterior à festa do Sagrado Coração de Jesus em San-Domingos.
- Ex.ª adiou a resposta como no ano antecedente, e depois veio a dizer tambêm que não se podia fazer ainda a referida peregrinação.
(…)
Felizmente a promessa pôde cumprir-se no ano seguinte.
No dia 21 de Agosto de 1921, saía realmente a peregrinação da igreja de San-Domingos, pelas 7 horas da manhã (hora oficial), e com o máximo brilhantismo e assistência de milhares de fiéis chegou ao monte de Santa Luzia, onde toda a cidade renovou a sua consagração ao Sagrado Coração de Jesus presente no SS.mo Sacramento exposto.
Para comemorar êste facto a actual Comissão das Obras do templo-Monumento mandou intercalar nas paredes da nova igreja uma lápide, cujos dizeres noutro lugar reproduzimos.”
Autor: João do Monte
Ad perpétuam rei memoriam
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EM AGOSTO DE 1926,
DIA DA INAUGURAÇÃO SOLENE DO CULTO RELIGIOSO
NA ÁBSIDE DÊSTE TEMPLO,
A CIDADE RENOVA A SUA CONSAGRAÇÃO
AO
SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS,
E, DE JOELHOS,
PROTESTA-LHE O SEU INDELÉVEL AGRADECIEMNTO
POR A TER LIBERTADO MILAGROSAMENTE
DA TERRÍVEL EPIDEMIA DA «PNEUMÓNICA»
EM 10 DE NOVEMBRO DE 1918.
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Misericórdias Dómini in aeternum cantabo
Boletim Santa Luzia
N.º 5 – Viana do Castelo, 1 de Agôsto de 1926 – Ano 1